Quando
ouvimos a palavra ‘estigma’ algo de negativo assalta-nos a mente, é uma palavra
que acompanha a pessoa com deficiência, seja qual for.
Podemos
ligá-la com outras: por exemplo, ‘identidade social’.
Quem
sou eu? Onde me insiro? Qual o meu papel na sociedade? Como é que os outros me
vêem? Como é que eu me vejo?
Temos
que parar, as perguntas jorram e há que estancá-las.
Comecemos
pelo conceito, os Gregos criaram este termo para se referirem a sinais
corporais que não eram mais que evidências de algo extraordinário ou algo
negativo sobre o status social vigente.
Hoje
em dia o conceito mantém-se, apesar de não se dar ênfase à marca corporal, mas
sim ao ‘problema’ que a pessoa tem.
A
sociedade, tão marcada pelo individualismo, tende a categorizar os indivíduos,
estabelecendo padrões comportamentais e atributos tidos como naturais dos
membros dessa categoria. Trata-se da identidade social.
Erving
Goffman (1982) fala-nos de dois tipos de identidade: a identidade social real e
a identidade social virtual. A identidade social virtual é aquilo que esperamos
de um determinado indivíduo dentro de um dado contexto; a identidade social
real é aquilo que o mesmo indivíduo prova possuir. Quando há diferença entre as
duas aparece o estigma, que traz conceitos de defeito, fraqueza e desvantagem.
O
indivíduo é, assim, colocado numa nova categoria.
Existem
três tipos de Estigma:
.
deformidades físicas;
.
culpas de carácter individual;
.
tribais de raça, nação e religião.
No
primeiro tipo, o estigma é devido a aparência física, com alterações daquilo
que é considerado ‘normal’.
No
segundo, o estigma é devido a questões de crença pessoal, de diversa ordem.
No
terceiro, o estigma está assente na raça, nação e religião de um indivíduo.
Espera-se um determinado comportamento conforme as situações acima citadas.
No
que diz respeito à deficiência o estigma está centrado nas imperfeições, na
diferença. No entanto, por vezes, e por razões históricas, atribui-se à
deficiência aspetos sobrenaturais, como no caso das pessoas cegas. Observemos o
caso apresentado por Goffman (1982):
“Alguns podem
hesitar em tocar ou guiar o cego, enquanto que outros generalizam a deficiência
de visão sob a forma de uma gestalt de incapacidade, de tal modo que o
indivíduo grita com o cego como se ele fosse surdo ou tenta erguê-lo como se
ele fosse aleijado. Aqueles que estão diante de um cego podem ter uma gama
enorme de crenças ligadas ao estereótipo. Por exemplo, podem pensar que estão
sujeitos a um tipo único de avaliação, supondo ou o indivíduo cego recorre a
canais específicos de informação não disponíveis para os outros.” (in Estigma:
Notas sobre a manipulação da Identidade Deteriorada, 1982, Brasil, Zahar
Editores, p.8)
Concluimos, então, que um indivíduo
que não preencha tudo o que dele se espera, que fuja da ‘norma’ socialmente
estabelecida, é um indivíduo estigmatizado.
Uma das características mais
notórias no indivíduo estigmatizado é a necessidade de ser aceite. Essa
necessidade leva-o a tentar corrigir essa ‘falha’. Goffman (1982) fala-nos em
“Vitimização”.
O indivíduo estigmatizado vai tentar
ultrapassar obstáculos que eram considerados inultrapassáveis para pessoas com
a sua problemática. Por outro lado poderá utilizar o estigma como desculpa para
eventuais fracassos.
É possível verificar que há muitas
formas de se lidar com o estigma. Há outros indivíduos que vêem no seu
sofrimento como que uma bênção secreta, na qual a sua experiência poderá servir
como ajuda e ensinamento a outras pessoas.
Goffman escreve:
"Isso
levaria imediatamente a se pensar que há muitos acontecimentos que podem
diminuir a satisfação de viver de maneira muito mais efetiva do que a cegueira.
Esse pensamento é inteiramente saudável. Desse ponto de vista, podemos
perceber, por exemplo, que um defeito como a incapacidade de aceitar amor
humano, que pode diminuir o prazer de viver até quase esgotá-lo, é muito mais
trágico do que a cegueira. Mas é pouco comum que o homem com tal doença chegue
a aperceber-se dela e, portanto, a ter pena de si mesmo." (in
Estigma: Notas sobre a manipulação da Identidade Deteriorada, 1982, Brasil,
Zahar Editores, p. 13)
Este episódio lembra-me algo que um ex-aluno cego me disse,
referindo-se a questões de relacionamentos, de amizade e amorosos. Ele disse-me
que, ao contrário de quase todos os seus amigos, ele não ligava ao aspeto
físico das pessoas e que dava realmente importância aquilo que as pessoas eram,
na sua essência, no seu interior e não na sua aparência exterior.
Este é um exemplo em como uma aparente limitação, vista aos olhos
daquilo que a sociedade tem como padrão, se torna uma vantagem.
FMM
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