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sábado, 18 de fevereiro de 2017

De olhos postos na Educação Especial... uma viagem pela Deficiência Visual! - sessão II

No dia 8 de fevereiro estivemos reunidos mais uma vez na ação de formação. Foi possível partilhar algumas ideias, discutir temas como o papel social das pessoas com deficiência visual, o preconceito e o estigma que ainda existe e tentámos eliminar alguns mitos relacionados com esta matéria.
Depois, abordámos a temática da orientação e mobilidade dando ênfase à importância que a mesma tem para a autonomia e bem estar de um cego.
Na imagem que aqui deixo vemos o grupo a simular uma situação de mobilidade com um guia. A tarefa foi muito simples, em pares deslocavam-se por vários espaços da escola, um com venda e outro a fazer de guia. A certa altura trocavam.
Cada um reagiu à sua maneira, mas foi possível constatar que todos eles consideraram como muito difícil a deslocação de olhos vendados. Alguns tiveram tonturas, outros chocaram com objetos (culpa do guia!!). 

Todos eles saíram com consciência de que não basta colocar uma venda para entender uma pessoa cega. No fim, todos a tiraram e voltaram à sua vida.

Um cego, esse, nunca tira a venda!

FMM

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

Orelhas 'grandes'!

O Sr. A.B. utente do GADV, com baixa visão extrema,  a propósito de alguém lhe ter dito que andava muito calado ultimamente, respondeu: "À medida que os olhos vão diminuindo, as orelhas vão crescendo. Agora oiço muito mais que antigamente, e com mais atenção."

Tendo ou não uma limitação visual, parece-me uma excelente ideia, ouvirmos mais os outros, prestando atenção ao que dizem. 
As pessoas escutam mas não ouvem. Na nossa sociedade nem sempre interessa o que outra pessoa tem para dizer, porque o que importa é aquilo que achamos e a opinião que temos sobre tudo.

Olhar e não ver.
Escutar e não ouvir.

FMM


quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Não basta pôr uma venda nos olhos...

Era uma vez um menino chamado António que era cego. Tinha perdido a visão há alguns anos e sempre se lembra de ter sido cego. Na sua memória guardava apenas algumas imagens, das faces da sua família mais chegada, das cores e pouco mais. Como qualquer outro menino, António andava na escola. O que para a maioria dos meninos era tarefa fácil, para António era um desafio. Para um menino cego, a autonomia e a autoconfiança não era garantida, conquistava-se, dia-a-dia, a pulso, com dificuldade, com passos pequenos mas seguros. Para isso, o menino contava com muitas ajudas, tinha uma senhora que o ajudava nos intervalos, porque nem sempre havia colegas disponíveis para o fazer (os meninos nas escolas básicas são muito ocupados e desaparecem nos intervalos, vão à sua vida - já referi este assunto no blog). Para além disso, tinha professores que o acompanhavam em quase todas as aulas. Haveria de haver um dia em que António seria um jovem completamente autónomo nos estudos e teria a destreza no Braille e a capacidade de registar tudo o que se passava nas aulas e aí sim, não precisaria de acompanhamento. Apesar de todas as dificuldades o menino António era um bom miúdo, com sentido de humor, muito confiante e agradável com todos. Quem tivesse o cuidado e a sorte de o conhecer melhor, conseguiria ver que, apesar de todas as dificuldades que tinha, era um miúdo destemido, adorava conhecer coisas novas e nunca virava a cara a novas aventuras.
Como qualquer menino cego o grande problema dele era a dificuldade que tinha em arranjar amigos. Num mundo a 200 à hora, onde a imagem, o parecer e a superficialidade pareciam ser dominantes, um menino como ele sentia-se deslocado, estranho, às vezes, quase impotente para ultrapassar as barreiras criadas pelas pessoas. Sim, por muito que se pense que o maior problema de um cego possam ser as barreiras arquitetónicas, a falta de acessos aos locais, a falta de sinalização de passadeiras, etc., o maior problema é a falta de sensibilidade, o preconceito e o estigma.
O António era cego, mas via e sentia essa falta de sensibilidade e até mesmo alguma crueldade por parte dos meninos da sua idade, da sua turma. Ele sabia que não podia ser amigo de todos. Ser cego não implicava que toda a gente gostasse dele. Também não queria que sentissem pena dele. Nem pensar.
O mundo era um local louco naqueles tempos. Os valores estavam todos invertidos. Não se respeitavam as diferenças e os meninos que estavam próximos do António não o respeitavam, não percebiam porque é que ele tinha tantas ajudas e por que é que as suas conquistas eram festejadas tão efusivamente. Os corações de alguns deles não tinham compaixão e a sua inveja crescia na mesma proporção da sua altura. Alguns deles, sabe-se lá porquê, também queriam ter essa atenção, também queriam ter professores que os acompanhassem nas aulas, ou uma senhora que os lembrasse que tinham que comer nos intervalos ou não os deixassem ficar sozinhos quando mais ninguém os queria acompanhar.
Esse sentimento fazia com que, por vezes, fossem cruéis com o António. É incrível como algumas atitudes podem estragar meses de trabalho no que diz respeito a autonomia, autoconfiança, e bem estar de um menino cego.
Nesse tempo só se dava importância aquilo que era visível. Observavam-se os privilégios, mas ignoravam-se as causas. Esses sentimentos negativos impediam que se visse mais além, que se olhasse a pessoa e se entendesse. O menino António não era um privilegiado. O menino António estava numa escola onde lhe eram dadas oportunidades de crescer, de se preparar para o futuro, de ganhar competências para sobreviver num mundo competitivo.
Será que os colegas que desejavam ter os mesmos "privilégios" estariam dispostos a colocar-se na mesma situação do António? NÃO!
Será que o António abdicaria de todos os "privilégios" para ter nem que fosse um pouco de visão que permitisse ser mais autónomo na escola? SIM!

Felizmente vivemos  numa sociedade moderna, onde os direitos dos meninos com deficiência visual (ou qualquer outra) estão salvaguardados. As crianças sabem respeitar as diferenças e apoiam os colegas que têm mais dificuldades. Quando um desses meninos consegue uma vitória, seja numa atividade da sala de aula, seja num torneio de uma qualquer modalidade, essa vitória é festejada como se fosse de todos. Hoje em dia, apesar de não termos de ser amigos de toda a gente, e não termos de ser amigos de um menino só porque ele tem uma deficiência qualquer, sabemos respeitar a condição do outro, agarramos no 'd' da palavra deficiência, mandamos fora, e transformamos em eficiência. Nos intervalos, em vez de fingirmos que não estamos ao lado do António, fazemos notar a nossa presença, e perguntamos se quer ir dar uma volta connosco. Olhamos para as ajudas que ele tem e compreendemos e ficamos felizes por estarmos numa escola que lhe dá essas condições. Nunca se sabe se não poderá acontecer algo semelhante connosco e não sermos nós a necessitar dessa ajuda, mesmo que temporária.
É bom viver num mundo assim.

FMM

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Conferência 'Deficiência, Inclusão e Direitos Humanos"

A APECI promoveu a Conferência com o tema “Deficiência, Inclusão e Direitos Humanos” que teve lugar hoje, dia 1 de fevereiro de 2017  no Auditório do edifício dos Paços do Concelho da Câmara Municipal de Torres Vedras. Esta ação foi dinamizada pela Dra. Isabel Felgueiras e pela Prof. Dra. Júlia Serpa Pimentel que apresentam uma larga experiência académica e profissional na abordagem desta temática. O objetivo principal desta ação foi o de refletirmos sobre a atualidade da inclusão das Pessoas com deficiência ou incapacidade na sociedade portuguesa e, em particular, na comunidade torreense. 


A sessão foi aberta pela vereadora Ana Umbelino que fez uma excelente reflexão sobre esta temática. Saliento uma frase que referiu na qual diz, e estou a citar de cor, que é a própria sociedade que cria a incapacidade dos outros, por não saber construir espaços que respeitem a diversidade. 

Fiquei a pensar nisto. De facto, somos nós (todos) que criamos muitas vezes essa incapacidade. A deficiência ou incapacidade do outro só é visível se ele tiver que desempenhar um determinado papel ou deslocar-se a um local e não conseguir. Se houver uma mudança de paradigma, na forma como olhamos a deficiência, talvez as diferenças se vão esbatendo cada vez mais, até, num cenário utópico, desaparecerem de vez. Uma pessoa em cadeira de rodas só se mostrará incapaz se lhe for 'exigido' algo que a sua condição não permita realizar. Uma escada, por exemplo, só será obstáculo se for a única forma de aceder a um local. Fica para reflexão.

Depois falou-se sobre os direitos humanos. A defesa dos direitos humanos e dos direitos das pessoas com deficiência ou incapacidade é algo que já vem de tempos muito remotos. É um processo inacabado, com altos e baixos, sensível a modas. Esses direitos não estão garantidos, é preciso defendê-los, cuidar deles e promovê-los. Hoje e sempre.

Tenho andado com outra preocupação, algo que tem merecido alguma reflexão da minha parte e que foi falado hoje na conferência. 
Ainda ontem, numa reunião com uma encarregada de educação, falávamos sobre a passagem, de um aluno com uma deficiência ou incapacidade, da escola para o mundo do trabalho. Como articular essa passagem? Como suavizar o choque do final da escolaridade e a passagem para a idade adulta? Para onde vai o jovem? Com quem fica? Conseguirá um trabalho? Conseguirá realizar um trabalho sequer? Terá autonomia para tratar dele próprio? Terá autonomia para se deslocar entre casa e o trabalho, se o tiver? Estará a escola a prepará-lo para o 'mundo real'? Estarão os pais preparados para deixá-los entrar no 'mundo real'?
Por enquanto, ficam as perguntas. Espero conseguir dar respostas no futuro.
É sempre uma angústia para pais e professores. 
Garantir o acesso às aprendizagens e resolver os problemas do dia-a-dia e projetar o futuro de alunos com alguma deficiência e incapacidade não é tarefa fácil. Arregacemos as mangas.
As conferências servem para isto mesmo, para pensar, mesmo que as ideias surjam algo confusas e os temas se misturem. É hora de arrumar as ideias.
FMM